domingo, 12 de fevereiro de 2017

Assertividade e a avaliação formativa




Com base nos estudos desenvolvidos pela pesquisadora Vera Martins (2005, p. 21), têm-se que assertividade é uma palavra derivada de asserção, que significa afirmar, confirmar, consolidar e declarar com firmeza. De acordo com Martins (2005, p. 22):

Entendemos assertividade como uma manifestação da possibilidade dialética de comunicação “eu ganho e você ganha”, ou seja, uma comunicação criativa, transparente, por meio da qual as pessoas expressam suas necessidades, seus pensamentos e sentimentos de forma honesta e direta, sem violar os mesmos direitos dos outros. Quando conseguimos expressar os nossos pensamentos, sentimentos e vontades sem agredir o outro, sentimo-nos leves e satisfeitos. Esse bem-estar é resultado da comunicação assertiva, constituída por pensamentos, sentimentos e ações que afirmam nosso eu.

Pessoalmente, para mim é muito fácil correlacionar os conceitos de avaliação formativa e assertividade, uma vez que a avaliação formativa prevê a abertura de espaço para o diálogo a partir da regulação e do feedback informativo, o que, consequentemente, promove a autorregulação, a ressignificação e a satisfação tanto do docente quanto do aluno.

“Uma pessoa assertiva vence pela influência, atenção e negociação, oferecendo ao outro a opção pela cooperação. Não oferece retaliações e estimula a comunicação de mão dupla” (Martins, 2005, p. 25). Mais uma concepção de assertividade intimamente relacionada ao conceito de avaliação formativa.




Resignação e a avaliação formativa



Resignação é um conceito controverso, de duplo sentido. Resignação é a tendência que uma pessoa tem de aceitar uma situação adversa. A controvérsia vem da possibilidade da aceitação ser negativa ou positiva. Desta maneira, nos resignamos diante de algo negativo quando somos capazes de assumir. Certos acontecimentos trazem consequências que podem ocasionar grande impacto emocional ou um sentimento de injustiça (uma desilusão amorosa, um amigo que nos engana, a morte de um ente querido ou uma demissão no trabalho sem nenhuma justificativa). Diante destas circunstâncias dolorosas e difíceis de assumir há duas possíveis reações: o desespero, a tristeza profunda e a rebeldia; por outro lado, entender que as situações adversas acontecem e por isso temos que aceitá-las (https://conceitos.com/resignacao/).

Aceitar as situações adversas pode se tornar uma necessidade em diversos momentos da vida. Nos processos de ensino-aprendizagem isso não é diferente. Mantendo o foco no assunto aqui tratado, muitas vezes a resignação diante dos processos avaliativos é necessária. Entretanto, isso pode ocorrer por diferentes motivos e, consequentemente, a resignação pode ser para o bem ou para o mal. 

As reformas educacionais neoliberais, envolvendo gestão, currículo e formação de docentes, por exemplo, direcionadas à competitividade e à valorização de conhecimentos necessários aos setores produtivos e mercadológicos submetem a educação a critérios de eficácia econômica (Lemos, 2009).

a escola passa a ser alvo de constantes investidas, a fim de garantir uma configuração mais próxima ao reordenamento exigido por essa perspectiva globalizante: as escolas adotam o modelo empresarial como referência de organização, alunos e pais perdem o status de cidadãos e convertem-se em clientes, propaga-se um discurso de subordinação da escola aos ditames econômicos, intensifica-se o controle externo da escola por políticas de avaliação que geram mecanismos de classificação, o fracasso escolar passa a ser encarado como uma questão meramente administrativa, entre outros (Lemos, 2009, p. 33).

Nestes casos, vemos a resignação de muitos docentes, que são forçados a aceitarem a situação imposta e submeterem-se ao sistema.

Por outro lado, há aqueles docentes que procuram novos caminhos através de um processo de revalorização pessoal e ressignificação do processo ensino-aprendizagem e buscam melhorar suas práticas docentes, mesmo sob condições adversas. É importante destacar que:

avaliação na aprendizagem como resultados baseados em notas, não classifica a capacitação do aluno ou a incapacitação do professor, é importante saber que determinadas avaliações não interferem no processo de aprendizagem, pois o aluno pode não ser excelente em algumas disciplinas e pode se destacar em outras, este fator depende da individualidade de cada aluno, pois cada um apresenta seu grau avaliativo, ou seja, o aluno sabe identificar em qual área se destaca mais ou menos e isto acaba se tornando um processo avaliativo individual (Cruz, 2013, p. 130).

Para que a avaliação seja formativa deve-se estabelecer critérios de avaliação a partir da convivência que permitam verificar a compreensão, o entendimento do conhecimento acerca de assunto ou tema. É importante que os determinantes do processo avaliativo e os instrumentos sejam definidos previamente, com objetivos claros tanto para o docente quanto para os alunos.

Nos casos em que o sistema educacional é mais rígido, muitas vezes é difícil a previsão de diferentes instrumentos avaliativos. Assim, cabe ao docente ser criativo para não fugir da situação adversa à qual está submetido e, ainda assim, permitir a qualificação adequada de seus alunos, promovendo oportunidades para a avaliação individual e coletiva de suas atividades enquanto docente e da formação de seus alunos. 



Cenas do filme O Triunfo, de 2006. Baseado em um personagem real, o educador Ron Clark, ele é centrado no personagem título, um professor de uma pequena cidade, que se muda para Nova York e tenta fazer uma diferença nas vidas de seus alunos, apesar de ninguém, incluindo os próprios estudantes, acreditar nele. Ron Clark é um jovem professor, criativo e idealista, sai de sua pequena cidade da Carolina do Norte para ensinar, em uma escola pública de Nova York. Através da utilização apaixonada de regras especiais para a sua sala de aula, ensinando técnicas altamente inovadoras e uma inesgotável devoção aos seus alunos, Clark é capaz de fazer uma notável diferença nas vidas de seus alunos.


Resiliência e a avaliação formativa



O conceito de resiliência faz referência à capacidade do ser humano responder de forma positiva às situações adversas que enfrenta, mesmo quando estas comportam risco potencial para sua saúde e/ou seu desenvolvimento. Esta capacidade é considerada por alguns autores como uma competência individual que se constrói a partir das interações entre o sujeito, a família e o ambiente e, para outros, como uma competência não apenas do sujeito, mas, também, de algumas famílias e de certas coletividades. Trata-se, portanto, de um fenômeno complexo, atrelado à interdependência entre os múltiplos contextos com os quais o sujeito interage de forma direta ou indireta e sobre o qual incide diferentes visões. (Silva et al., 2003, p. 147-148)

Rutter (1999) refere-se à resiliência como uma relativa “resistência” manifestada por algumas pessoas diante de situações consideradas potencialmente de risco psicossocial para seu funcionamento e desenvolvimento. A resiliência é um conceito importante, com muitas possibilidades de aplicação.

A partir do problema de investigação, ou seja, a preocupação dos docentes em relação à postura dos alunos durante a realização de uma avaliação em busca da “resposta do gabarito”, das duas concepções de resiliência apresentadas e transpondo o conceito para os processos de avaliação, acredito que a resiliência pode contribuir para o ensino-aprendizagem a partir das adversidades que docentes e alunos se deparam ao longo do processo. A ideia de que a resiliência pode representar resistência de algumas pessoas diante de algumas situações me faz pensar no docente que não quer pensar em instrumentos de avaliação que favoreçam o ensino, a crítica, a reflexão do conhecimento adquirido e o direcionamento para novos rumos. Muitos docentes que atuam na academia são formados pelos métodos tradicionais de ensino, em que as aulas são ministradas como palestras, com pouco ou nenhum espaço aberto para o diálogo e/ou argumentação. Eu suponho que uma parte desses docentes acredita que foram formados pelos métodos tradicionais, conseguiram concluir a sua formação e são profissionais de sucesso; portanto, por que mudar se deu tudo certo até agora? Consequentemente assumem que aquele modelo é o certo e que não há necessidade de revisá-lo. Assim, mantêm o aluno como mero receptor das informações, tornando-o capaz de reproduzi-las, sem incentivá-lo a questionar, debater. Os sistemas de avaliação desses docentes costumam seguir o mesmo tradicionalismo, sendo baseados em avaliações que exigem a memorização, na premiação com base na nota ou punição quando há nota inferior. Quando são questionados sobre os diferentes instrumentos de avaliação, prontamente respondem que promovem seminários, pedem relatórios de aulas ou passam trabalhos de pesquisa para serem feitos fora da sala de aula. Entretanto, a forma como essas atividades são orientadas e conduzidas, em muitas situações, não promovem a aprendizagem integral. Para mim, estes fatos permitem imaginar a situação confortável para esses docentes, em relação aos sistemas tradicionais de avaliação, para o planejamento, execução e correção dos instrumentos de avaliação utilizados. A palavra correção aparece intencionalmente destacada, porque no sistema avaliativo descrito não há determinantes pré-estabelecidos e/ou critérios claros para a avaliação efetiva do processo ensino-aprendizagem; há apenas a coleta de informação, a verificação (geralmente com gabaritos) e posterior atribuição de nota. Ao mesmo tempo, entendo que é muito difícil para uma pessoa que já passou por todos os processos de formação e atuam profissionalmente na atividade docente deixar ou abrir mão daquilo que fez parte de sua formação.

Um fato importante para se destacar e considerar é que, em muitas situações, os docentes tornam-se reféns dos fenômenos acadêmicos, atuando de acordo com a proposta educativa do departamento e/ou instituição e, consequentemente apresentando uma identidade aparentemente inadequada de atuação.

Por outro lado, quando penso na concepção apresentada por Silva et al. (2003), acredito que o aluno que passou por sistemas de avaliação classificatórios devem aprender com suas experiências. De acordo com Moraes (2014, p. 291)

é no tempo e no espaço da formação que o futuro educador deve vivenciar inúmeras experiências que o ajudem a (re)construir novas crenças embasadas em conhecimentos científicos para que ele possa sair da universidade com concepções diferentes das de quando entrou.

Assim, a reconstrução dos sistemas avaliativos de classificatórios para formativos representariam a capacidade do aluno em responder de forma positiva à situação adversa de avaliações que vivenciou durante o seu percurso de formação. Aproveito aqui para retomar uma frase das minhas primeiras postagens: aprendemos com os nossos professores o que fazer e o que não fazer. Portanto, recomendo aos alunos de hoje que repensem as suas experiências, sejam elas boas ou ruins; se autorregulem; ressignifiquem e usem os exemplos de forma positiva para a sua (re)construção. Isso se aplica aos sistemas de avaliações e para tudo em nossas vidas.






Cruz, J.A.S. Ensino superior: as avaliações como forma de reflexão no aprendizado. Cadernos de Educação, Tecnologia e Sociedade, v. 4, n. 1, p. 127-136, 2013.

Lemos, J.C.G. Do encanto ao desencanto, da permanência ao abandono: o trabalho docente e a construção da identidade profissional. Tese de Doutorado. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica, 2009, 315 p.

Moraes, D.A.F. A prova formativa na Educação superior: possibilidade de regulação e autorregulação. Est. Aval. Educ., São Paulo, v. 25, n. 58, p. 272-294, 2014.

Rutter, M. Resilience concepts and findings: implications for family therapy. Journal of Family Therapy, v. 21, p. 119-144, 1999.

Silva, M.R.S., Elsén, I., Lacharité, C. Resiliência: concepções, fatores associados e problemas relativos à construção do conhecimento na área. Paidéia, v. 13, n. 26, p. 147-156, 2003.

Martins, V.L.F. Seja assertivo! 6ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, 236 p. (https://books.google.pt/books?id=TR4BwkFg0qoC&pg=PA3&hl=pt-BR&source=gbs_selected_pages&cad=2#v=onepage&q&f=false)


Um comentário:

  1. Ótimo texto Raquel, muito provocativo. Nos leva a várias reflexões. O que mais me chamou a atenção foi a resiliência, considero que esta seja fundamental no processo.
    Ocorre um certo engessamento do professor pelo próprio sistema e ele acaba agindo por condicionamento, um pouco como a história que contou anteriormente, que carrega pesos e nem sabia os motivos.

    ResponderExcluir