Assertividade e a avaliação formativa
Com base nos estudos
desenvolvidos pela pesquisadora Vera Martins (2005, p. 21), têm-se que
assertividade é uma palavra derivada de asserção, que significa afirmar,
confirmar, consolidar e declarar com firmeza. De acordo com Martins (2005, p.
22):
Entendemos assertividade como uma
manifestação da possibilidade dialética de comunicação “eu ganho e você ganha”,
ou seja, uma comunicação criativa, transparente, por meio da qual as pessoas
expressam suas necessidades, seus pensamentos e sentimentos de forma honesta e
direta, sem violar os mesmos direitos dos outros. Quando conseguimos expressar
os nossos pensamentos, sentimentos e vontades sem agredir o outro, sentimo-nos
leves e satisfeitos. Esse bem-estar é resultado da comunicação assertiva,
constituída por pensamentos, sentimentos e ações que afirmam nosso eu.
Pessoalmente, para mim
é muito fácil correlacionar os conceitos de avaliação formativa e
assertividade, uma vez que a avaliação formativa prevê a abertura de espaço
para o diálogo a partir da regulação e do feedback
informativo, o que, consequentemente, promove a autorregulação, a
ressignificação e a satisfação tanto do docente quanto do aluno.
“Uma pessoa assertiva
vence pela influência, atenção e negociação, oferecendo ao outro a opção pela
cooperação. Não oferece retaliações e estimula a comunicação de mão dupla”
(Martins, 2005, p. 25). Mais uma concepção de assertividade intimamente
relacionada ao conceito de avaliação formativa.
Resignação e a avaliação formativa
Resignação é um
conceito controverso, de duplo sentido. Resignação é a tendência que uma pessoa
tem de aceitar uma situação adversa. A controvérsia vem da possibilidade da
aceitação ser negativa ou positiva. Desta maneira, nos resignamos diante de
algo negativo quando somos capazes de assumir. Certos acontecimentos trazem
consequências que podem ocasionar grande impacto emocional ou um sentimento de
injustiça (uma desilusão amorosa, um amigo que nos engana, a morte de um ente
querido ou uma demissão no trabalho sem nenhuma justificativa). Diante destas
circunstâncias dolorosas e difíceis de assumir há duas possíveis reações: o
desespero, a tristeza profunda e a rebeldia; por outro lado, entender que as
situações adversas acontecem e por isso temos que aceitá-las (https://conceitos.com/resignacao/).
Aceitar as situações
adversas pode se tornar uma necessidade em diversos momentos da vida. Nos
processos de ensino-aprendizagem isso não é diferente. Mantendo o foco no
assunto aqui tratado, muitas vezes a resignação diante dos processos
avaliativos é necessária. Entretanto, isso pode ocorrer por diferentes motivos
e, consequentemente, a resignação pode ser para o bem ou para o mal.
As reformas
educacionais neoliberais, envolvendo gestão, currículo e formação de docentes,
por exemplo, direcionadas à competitividade e à valorização de conhecimentos
necessários aos setores produtivos e mercadológicos submetem a educação a
critérios de eficácia econômica (Lemos, 2009).
a escola passa a ser alvo de
constantes investidas, a fim de garantir uma configuração mais próxima ao
reordenamento exigido por essa perspectiva globalizante: as escolas adotam o
modelo empresarial como referência de organização, alunos e pais perdem o
status de cidadãos e convertem-se em clientes, propaga-se um discurso de
subordinação da escola aos ditames econômicos, intensifica-se o controle
externo da escola por políticas de avaliação que geram mecanismos de
classificação, o fracasso escolar passa a ser encarado como uma questão
meramente administrativa, entre outros (Lemos, 2009, p. 33).
Nestes casos, vemos a
resignação de muitos docentes, que são forçados a aceitarem a situação imposta
e submeterem-se ao sistema.
Por outro lado, há
aqueles docentes que procuram novos caminhos através de um processo de
revalorização pessoal e ressignificação do processo ensino-aprendizagem e
buscam melhorar suas práticas docentes, mesmo sob condições adversas. É
importante destacar que:
avaliação na aprendizagem como
resultados baseados em notas, não classifica a capacitação do aluno ou a incapacitação
do professor, é importante saber que determinadas avaliações não interferem no
processo de aprendizagem, pois o aluno pode não ser excelente em algumas
disciplinas e pode se destacar em outras, este fator depende da individualidade
de cada aluno, pois cada um apresenta seu grau avaliativo, ou seja, o aluno
sabe identificar em qual área se destaca mais ou menos e isto acaba se tornando
um processo avaliativo individual (Cruz, 2013, p. 130).
Para que a avaliação seja formativa
deve-se estabelecer critérios de avaliação a partir da convivência que permitam
verificar a compreensão, o entendimento do conhecimento acerca de assunto ou
tema. É importante que os determinantes do processo avaliativo e os
instrumentos sejam definidos previamente, com objetivos claros tanto para o
docente quanto para os alunos.
Nos casos em que o
sistema educacional é mais rígido, muitas vezes é difícil a previsão de
diferentes instrumentos avaliativos. Assim, cabe ao docente ser criativo para
não fugir da situação adversa à qual está submetido e, ainda assim, permitir a
qualificação adequada de seus alunos, promovendo oportunidades para a avaliação
individual e coletiva de suas atividades enquanto docente e da formação de seus
alunos.
Cenas do filme O Triunfo, de 2006. Baseado em um personagem real, o educador Ron
Clark, ele é centrado no personagem título, um professor de uma pequena cidade,
que se muda para Nova York e tenta fazer uma diferença nas vidas de seus
alunos, apesar de ninguém, incluindo os próprios estudantes, acreditar nele.
Ron Clark é um jovem professor, criativo e idealista, sai de sua pequena cidade
da Carolina do Norte para ensinar, em uma escola pública de Nova York. Através
da utilização apaixonada de regras especiais para a sua sala de aula, ensinando
técnicas altamente inovadoras e uma inesgotável devoção aos seus alunos, Clark
é capaz de fazer uma notável diferença nas vidas de seus alunos.
Resiliência e a avaliação formativa
O conceito de resiliência faz
referência à capacidade do ser humano responder de forma positiva às situações
adversas que enfrenta, mesmo quando estas comportam risco potencial para sua
saúde e/ou seu desenvolvimento. Esta capacidade é considerada por alguns
autores como uma competência individual que se constrói a partir das interações
entre o sujeito, a família e o ambiente e, para outros, como uma competência
não apenas do sujeito, mas, também, de algumas famílias e de certas
coletividades. Trata-se, portanto, de um fenômeno complexo, atrelado à
interdependência entre os múltiplos contextos com os quais o sujeito interage
de forma direta ou indireta e sobre o qual incide diferentes visões. (Silva et
al., 2003, p. 147-148)
Rutter (1999) refere-se
à resiliência como uma relativa “resistência” manifestada por algumas pessoas diante
de situações consideradas potencialmente de risco psicossocial para seu
funcionamento e desenvolvimento. A resiliência é um conceito importante, com
muitas possibilidades de aplicação.
A partir do problema de
investigação, ou seja, a preocupação dos docentes em relação à postura dos
alunos durante a realização de uma avaliação em busca da “resposta do
gabarito”, das duas concepções de resiliência apresentadas e transpondo o
conceito para os processos de avaliação, acredito que a resiliência pode
contribuir para o ensino-aprendizagem a partir das adversidades que docentes e
alunos se deparam ao longo do processo. A ideia de que a resiliência pode
representar resistência de algumas pessoas diante de algumas situações me faz
pensar no docente que não quer pensar em instrumentos de avaliação que favoreçam
o ensino, a crítica, a reflexão do conhecimento adquirido e o direcionamento
para novos rumos. Muitos docentes que atuam na academia são formados pelos métodos
tradicionais de ensino, em que as aulas são ministradas como palestras, com
pouco ou nenhum espaço aberto para o diálogo e/ou argumentação. Eu suponho que
uma parte desses docentes acredita que foram formados pelos métodos
tradicionais, conseguiram concluir a sua formação e são profissionais de
sucesso; portanto, por que mudar se deu tudo certo até agora? Consequentemente
assumem que aquele modelo é o certo e que não há necessidade de revisá-lo.
Assim, mantêm o aluno como mero receptor das informações, tornando-o capaz de
reproduzi-las, sem incentivá-lo a questionar, debater. Os sistemas de
avaliação desses docentes costumam seguir o mesmo tradicionalismo, sendo
baseados em avaliações que exigem a memorização, na premiação com base na nota
ou punição quando há nota inferior. Quando são questionados sobre os diferentes
instrumentos de avaliação, prontamente respondem que promovem seminários, pedem
relatórios de aulas ou passam trabalhos de pesquisa para serem feitos fora da
sala de aula. Entretanto, a forma como essas atividades são orientadas e
conduzidas, em muitas situações, não promovem a aprendizagem integral. Para
mim, estes fatos permitem imaginar a situação confortável para esses docentes,
em relação aos sistemas tradicionais de avaliação, para o planejamento,
execução e correção dos instrumentos de avaliação utilizados. A palavra
correção aparece intencionalmente destacada, porque no sistema avaliativo
descrito não há determinantes pré-estabelecidos e/ou critérios claros para a
avaliação efetiva do processo ensino-aprendizagem; há apenas a coleta de
informação, a verificação (geralmente com gabaritos) e posterior atribuição de
nota. Ao mesmo tempo, entendo que é muito difícil para uma pessoa que já passou
por todos os processos de formação e atuam profissionalmente na atividade
docente deixar ou abrir mão daquilo que fez parte de sua formação.
Um fato importante para
se destacar e considerar é que, em muitas situações, os docentes tornam-se
reféns dos fenômenos acadêmicos, atuando de acordo com a proposta educativa do
departamento e/ou instituição e, consequentemente apresentando uma identidade
aparentemente inadequada de atuação.
Por outro lado, quando
penso na concepção apresentada por Silva et al. (2003), acredito que o aluno
que passou por sistemas de avaliação classificatórios devem aprender com suas
experiências. De acordo com Moraes (2014, p. 291)
é no tempo e no espaço da
formação que o futuro educador deve vivenciar inúmeras experiências que o ajudem
a (re)construir novas crenças embasadas em conhecimentos científicos para que
ele possa sair da universidade com concepções diferentes das de quando entrou.
Assim, a reconstrução
dos sistemas avaliativos de classificatórios para formativos representariam a
capacidade do aluno em responder de forma positiva à situação adversa de
avaliações que vivenciou durante o seu percurso de formação. Aproveito aqui para
retomar uma frase das minhas primeiras postagens: aprendemos com os nossos
professores o que fazer e o que não fazer. Portanto, recomendo aos alunos de
hoje que repensem as suas experiências, sejam elas boas ou ruins; se
autorregulem; ressignifiquem e usem os exemplos de forma positiva para a sua
(re)construção. Isso se aplica aos sistemas de avaliações e para tudo em nossas
vidas.
Cruz, J.A.S. Ensino
superior: as avaliações como forma de reflexão no aprendizado. Cadernos de Educação, Tecnologia e
Sociedade, v. 4, n. 1, p. 127-136, 2013.
Lemos, J.C.G. Do encanto ao desencanto, da permanência ao
abandono: o trabalho docente e a construção da identidade profissional.
Tese de Doutorado. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica, 2009, 315 p.
Moraes, D.A.F. A prova
formativa na Educação superior: possibilidade de regulação e autorregulação. Est.
Aval. Educ., São
Paulo, v. 25, n. 58, p. 272-294, 2014.
Rutter, M. Resilience concepts and findings: implications
for family therapy. Journal
of Family Therapy, v. 21, p. 119-144, 1999.
Silva, M.R.S., Elsén,
I., Lacharité, C. Resiliência: concepções, fatores associados e problemas
relativos à construção do conhecimento na área. Paidéia, v. 13, n. 26, p. 147-156, 2003.
Martins, V.L.F. Seja
assertivo! 6ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, 236 p. (https://books.google.pt/books?id=TR4BwkFg0qoC&pg=PA3&hl=pt-BR&source=gbs_selected_pages&cad=2#v=onepage&q&f=false)
Ótimo texto Raquel, muito provocativo. Nos leva a várias reflexões. O que mais me chamou a atenção foi a resiliência, considero que esta seja fundamental no processo.
ResponderExcluirOcorre um certo engessamento do professor pelo próprio sistema e ele acaba agindo por condicionamento, um pouco como a história que contou anteriormente, que carrega pesos e nem sabia os motivos.