Avaliação e planejamento educacional: problemas conceituais e metodológicos
Maria Amélia Azevedo Goldberg
Cadernos de Pesquisa, n. 7, Fundação Carlos Chagas, São Paulo, 1973.
Este texto foi
selecionado porque, apesar da data de publicação, apresenta conceitos claros
que podem ser utilizados tranquilamente nos dias atuais. A abordagem baseia-se
na apresentação de conceitos associados ao tema principal do artigo e permite a
melhor compreensão do foco dado ao problema de investigação. O texto foi
subdividido nas seguintes seções: A natureza do processo educacional, A
sistemática do planejamento educacional, Conceituação de avaliação educacional,
Relações entre o teste da eficácia e o “teste” de eficiência de um programa
educacional.
Na seção intitulada A natureza do processo educacional a
autora apresenta o conceito de educação, concebido como um processo de
influência interpessoal [ensino], visando a produção de mudanças
comportamentais no aluno [aprendizagem]. Assim, a produção de mudanças
comportamentais depende do padrão de influências exercido sobre ele. Nesta
seção são apresentadas as variáveis do processo ensino-aprendizagem, agrupadas
em três classes: variáveis antecedentes, variáveis processuais e variáveis-produto.
Variáveis
antecedentes abrangem as condições pré-existentes à
interação professor-aluno. Entre essas estão as i) variáveis do professor, ou
seja, aquelas inerentes à sua postura pessoal (atitudes, interesses, etc) e
profissional (conhecimentos e habilidades específicas, rendimento, etc); ii) as
variáveis do aluno, que incluem conhecimento prévio, atitudes e todo o
potencial para a aprendizagem que o aluno traz consigo; iii) variáveis
contextuais, constituídas pelo ambiente e condições externas que podem
influenciar a interação professor-aluno, incluindo os aspectos sociais,
econômicos e institucionais.
Variáveis
processuais abrangem todas as interações
professor-aluno e todas as formas pelas quais o aluno tem de lidar com material
didático e entrar em interação com os demais elementos do grupo instrucional.
Variáveis-produto
referem-se às mudanças comportamentais produzidas no aluno, refletindo
modificações em conhecimentos, habilidades, interesses e atitudes.
A convergência e a inter-relação
entre as três variáveis do processo ensino-aprendizagem deve ser mediada pelo
professor que, por sua vez, deve ter o controle da situação. O planejamento
educacional promove este controle.
Na seção A sistemática do planejamento educacional
o conceito de planejamento é apresentado como um processo de controle que
dirige e determina as ações de uma pessoa, em busca de um objetivo determinado.
É um processo de tomada, execução e teste de decisões.
O planejamento deve constituir-se
por decisões relativas a objetivos ou metas, que devem definir quais mudanças
produzir no comportamento do aluno, e por decisões relativas a meios ou
estratégias, ou seja, como produzir tais mudanças. Essas decisões, por sua vez,
constituem-se nas etapas de elaboração e aprovação do plano.
O planejamento
considera, ainda, o sistema de dados, sistema de previsão e sistema de valores.
O sistema de dados elenca as
alternativas disponíveis para o planejador e pode ser associada à probabilidade
de suas consequências ou efeitos. O sistema
de previsão é o conjunto de métodos ou técnicas para estimar as
probabilidades. O sistema de valores
representa a atribuição de valor às consequências de uma dada alternativa. Os
sistemas de dados, de previsão e de valores possibilitam ao planejador a
elaboração de critérios para a tomada de decisões acerca das metas e
estratégias.
O planejamento é também
um processo de execução. As decisões deverão traduzir-se em ações que, por sua
vez, vão gerar resultados.
A validação da seleção adequada
de objetivos e estratégias é dada pela avaliação educacional, ou seja, o
julgamento dessa seleção é realizado por meio de avaliação que, de acordo com a
autora, constitui-se o teste de racionalidade dos processos decisórios e
executórios de um planejamento. A racionalidade dos processos decisórios
depende dos momentos de avaliação denominados de i) avaliação diagnóstica, que antecede a elaboração
de um plano ou programa; ii) avaliação “ex
ante”, realizada entre as etapas de elaboração e aprovação do plano. A racionalidade
dos processos executórios é assegurada pela i) avaliação “in processu”, que acompanha a própria execução
do plano; ii) avaliação “ex post”,
posterior à obtenção dos resultados.
A finalidade de todos
os momentos de avaliação é produzir informações capazes de confirmar ou
modificar as próprias decisões e ações dentro do planejamento,
caracterizando-se como instrumentos autorreguladores do sistema.
Na seção de Conceituação de avaliação educacional,
o conceito de avaliação educacional é dado como processo de coletar, analisar e
interpretar evidências relativas à eficácia e eficiência de programas
educacionais.
A eficácia de programa
educacional refere-se ao valor e viabilidade de seus objetivos educacionais. Considerando
o papel social da educação, o valor de um objetivo educacional será em função
de sua utilidade social. Assim um programa educacional será mais eficaz quanto
mais responder às demandas da sociedade como um todo a partir das mudanças
comportamentais desejadas no aluno. A eficácia corresponde à aceitação e utilização
pela sociedade do produto final do processo educacional, o egresso, quer seja
no mercado de trabalho, no ingresso em níveis subsequentes de ensino ou para o
desempenho de múltiplos papeis sociais.
Entretanto, a eficácia
não significa a acomodação do sistema educacional ao sistema socioeconômico,
sem modificação de suas demandas. As avaliações diagnósticas e “ex ante”
são duas formas que o planejador, no caso o docente, tem de controlar a
racionalidade e, portanto, a eficácia de suas decisões relativas aos objetivos
educacionais. A avaliação diagnóstica permite ao planejador se informar sobre a
realidade em que vai intervir/comportamento de entrada do aluno (sistema de
dados), das linhas tendenciais de desenvolvimento/evolução (sistema de previsão)
e do que deve ser (sistema de valores), o que lhe permite a formulação de critérios
para orientar as suas ações no sentido de superar deficiências ou estimular as
excelências diagnósticas, fundamentando suas decisões sobre metas e estratégias.
Na medida em que o
diagnóstico visa capacitar o planejador para a tomada de decisões valiosas e
realistas, é importante também avaliar as disponibilidades operacionais e/ou
recursos disponíveis no contexto em que ele irá atuar e dos prováveis
obstáculos/resistências que irão surgir para a garantia da viabilidade das
decisões a serem tomadas.
A eficiência de um
programa educacional também diz respeito aos seus objetivos educacionais, ou
seja, se estes estão sendo ou foram atingidos pela maioria dos alunos, da
melhor maneira possível. A avaliação da eficiência de um programa educacional é
realizada por meio da avaliação “in
processu”, que implica na fiscalização ou controle da etapa executória do
programa, a fim de determinar i) se a execução segue o que foi planejado; ii) o
investimento em termos de esforço, tempo e custo; iii) a interferência dos
fatores não previstos. Já a avaliação “ex
post” visa saber se os objetivos educacionais atingidos foram de fato
produzidos pelo programa educacional, permitindo ao planejador que ele mantenha,
reforce ou modifique o planejamento desenvolvido, na dependência dos resultados
obtidos na avaliação.
Na seção Relações entre o teste da eficácia e o
“teste” de eficiência de um programa educacional a autora reforça que
qualquer programa de ensino-aprendizagem, para ser considerado eficaz, deve
definir hierarquicamente seus objetivos e garantir e compatibilização entre
eles, numa cadeia de meios e fins. A hierarquia de objetivos deve corresponder a
uma hierarquia de resultados possíveis, que serão tanto mais mediatos quanto
mais gerais os objetivos a que corresponderem e vice-versa. Através do teste de
eficiência, os objetivos-meio terão também comprovados sua eficácia ou sua
racionalidade funcional. Assim, o teste de eficiência pode vir a ser também um
teste de eficácia de um programa educacional.
Educação escolar e resiliência: política de educação e a prática docente em meios adversos
Indinalva
Nepomuceno Fajardo, Maria Cecilia de Souza Minayo,
Carlos
Otávio Fiúza Moreira
Ensaio: Avaliação e Políticas
Públicas em Educação, Rio de Janeiro, v. 18, n. 69, p. 761-774, 2010
Este artigo foi
selecionado porque trata da resiliência na educação escolar, tendo como
referência os professores em sua prática profissional. A resiliência “permite
aos profissionais da educação encarar de outra forma a evolução de seus alunos”
(Poletti; Dobbs, 2007, p. 17).
O texto inicia-se com a
apresentação de diferentes conceitos de resiliência que indicam a diferenciação
de objetos, materiais e seres vivos por sua capacidade de resistência em
relação a outros elementos que a eles são semelhantes. O processo de
resiliência para o ser humano caracteriza-se por um conjunto de processos
sociais e intrapsíquicos que possibilitam à pessoa ter uma vida saudável em
condições adversas; conjunto de qualidades que favorecem o processo da
adaptação criativa e a transformação a partir dos riscos e adversidades. Este
processo sofre a influência da família, dos suportes sociais e da educação.
Há professores que
apresentam maior resistência aos fatores agressores encontrados na prática,
criando alternativas para controlar os desafios e responder às dificuldades,
reagindo às adversidades e mostrando-se capazes de recuperação das agressões
sofridas. Esses profissionais detêm características que fortalecem a
resiliência. É imprescindível que a escola desdobre todo o potencial e recursos
ao seu alcance para conseguir uma comunidade educativa inclusiva e resiliente.
Seis passos que estimulam a construção de características próprias de um
docente resiliente:
Seis passos
que estimulam a construção de características próprias de um docente
resiliente, de acordo com Hendersen e Milstein (2005)
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Sete passos
para o desenvolvimento da resiliência, de acordo com Wolin e Wolin (1993):
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Enriquecer
os vínculos;
Determinar
limites claros e fortes;
Ensinar
habilidades para a vida;
Proporcionar
afeto e apoio;
Estabelecer
e transmitir expectativas elevadas;
Proporcionar
oportunidades de participação significativa.
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Tomada
de consciência, ou capacidade de identificar os problemas e suas raízes e procurar
soluções;
Independência,
baseada na capacidade de estabelecer limites entre si mesmo e as pessoas
próximas, não se deixando envolver pela corrente adversa;
Desenvolvimento
de relações satisfatórias com os outros;
Iniciativa
que permite se controlar e controlar seu ambiente tendo prazer ao realizar
atividades construtivas;
Criatividade,
ou seja, capacidade de pensar de forma diferente dos outros e encontrar
refúgio num mundo imaginário quando necessário;
Humor,
cujo objetivo é diminuir a tensão interior e desvendar o lado cômico das
tragédias;
Ética,
como guia da ação, e frente ao risco de viver com base nesses valores.
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A
escola protetora e os sujeitos resilientes no ambiente educativo
Boa parte dos
professores da escola pública brasileira constitui exemplo de pessoas
resilientes. Essa qualidade aparece com graus diversificados que podem ser
alterados pela educação e formação continuada dos professores, criando-se
formas de superação dos problemas coletivos, incentivando a autodescoberta, o
autoconhecimento e a automotivação.
Diversos autores ressaltam
a importância da resiliência na educação escolar, pois para eles, a escola é um
dos espaços promotores de resiliência mais potentes que a sociedade pode implementar,
por apresentar duas condições importantes. A primeira, porque agrupa distintos
sistemas humanos; a segunda, porque articula a pessoa do professor ao aluno
dentro de uma perspectiva de desenvolvimento humano, de proteção, e não de
fatores de risco.
Depois da família, a
escola é o meio fundamental e essencial para que as crianças, na sala de aula,
adquiram as competências necessárias para ter sucesso na vida, por meio da
superação das adversidades. Portanto, saber lidar com as formas de promover a
resiliência é a chave para a educação cumprir objetivos fundamentais tais como
formar pessoas livres e indivíduos responsáveis.
Para se construir uma escola
resiliente, é preciso que os professores sejam instados a compreender a
importância de desenvolver estratégias de fortalecimento das pessoas e sejam
preparados para isso, sabendo lidar com situações estressantes e adversas. para
que haja o desenvolvimento de competência, habilidades e estratégias para o
fortalecimento dos sujeitos resilientes no ambiente educativo, é essencial
privilegiar o presente, o aprender a aprender abrindo-se, assim, um leque maior
de mecanismos de proteção. Por isso, a transformação da escola em uma
comunidade resiliente exige um olhar atento do docente, tendo autoconfiança, persistência,
criatividade, bom humor, liderança, capacidade de produzir conhecimento,
relacionamento interpessoal e capacidade de sonhar. O professor tem que desenvolver,
em si, a capacidade de se libertar dos trilhos que construíram suas representações
de escola e de educação. Pensar escola na sociedade contemporânea é pensar em
reorientar o ser humano no mundo, é reconfigurar o espaço e o tempo de aprender
e ensinar, é reelaborar a cultura pessoal e profissional.
As
contribuições da resiliência para uma educação em crise
No campo educacional
brasileiro hoje, os professores, em sua grande maioria, são reféns de uma
situação na qual não conseguem ser ouvidos como profissionais sérios e capazes.
Porém, também os docentes costumam estar mais aptos a apontar os “nós” do
sistema do que enfrentá-los, mesmo porque, são vistos como meros executores de
tarefas. A crescente frustração que domina os profissionais da educação gera
prejuízos que os atingem e estão à vista de todos: desmotivação pessoal e
elevados índices de absentismo e de abandono, insatisfação profissional
traduzida numa atitude de desinvestimento e de indisposição constante.
A resiliência como o
processo de lidar com acontecimentos vitais dissociadores, estressantes ou
amenizadores proporciona ao indivíduo destrezas protetoras e defensivas. A
escola pode contribuir ao dar condições ambientais que promovam reações resilientes
perante circunstâncias imediatas, assim como enfoques educativos, programas e
currículos adequados para o desenvolvimento de fatores protetores individuais.
Ao investir na resiliência do professor, uma administração escolar sábia está
fomentando o êxito escolar e social dos alunos.
Concluindo, a resiliência na ação docente se consolida com a valorização, pelo próprio
professor, da importância de fortalecer uma atuação dialógica, crítica, ética,
participativa e colaborativa, que lhe permita refletir sobre suas decisões,
criando-se, desta forma, um ambiente de suporte afetivo e emocional necessário
para trabalhar. Para tanto, há necessidade de realizar pesquisas que contribuam
para que o país dê um salto qualitativo em conceitos e propostas que torne a
escola um fator importante nas transformações requeridas pela sociedade
contemporânea.
Ótimo trabalho, você sintetiza muito bem.
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